Analisar friamente os testes feitos por Paulo Sousa no começo de trabalho no Flamengo é ignorar a cultura do futebol brasileiro e do próprio clube. Embora seja esse o papel de quem decifra as ideias táticas do novo comandante, estes estão imunes ao que torcedores, conselheiros e até dirigentes do clube estão sujeitos: a paixão.
Há outro lado que precisa ser levado em consideração, que é o dos próprios atletas testados e o histórico recente desses experimentos no Flamengo. Quando colocados em situações desconfortáveis por Abel Braga, Domenéc Torrent, Rogério Ceni e Renato Gaúcho, o vestiário se incomodou. Até agora, Paulo Sousa tem respaldo dos jogadores para o trabalho.
– Fizemos uma boa partida, melhorando pouco a pouco, colocando em prática. Com tempo vamos melhorar. O Paulo tem feito um grande trabalho – disse o atacante Gabigol após a vitória sobre o Audax.
Na direção do Flamengo, há liberdade para que as observações sejam feitas em uma pré-temporada prolongada. Mas em breve há outro fator inerente à cultura local que pode influenciar: jogos decisivos como a final da Supercopa, contra um Atlético-MG que se tornou rival racional ferrenho novamente. E, é claro, a cobrança por resultado voltará de vez.
Sabe-se que os testes não serão suficientes para preparar o Flamengo nem fisica nem taticamente para estar de cara nova e com força e desempenho máximos na partida do próprio dia 20. Não à toa Paulo Sousa já avisou que precisaria de sete jogos para tentar implementar seu estilo, mas o resultado vem à frente em ocasiões como essa.
A filosofia de preparar o elenco para o ano todo, com mão pesada nos treinamentos físicos, cobra o preço. Os jogadores ainda estão desgastados e, por isso, há rodízio e dosagem de minutos. Longe da melhor forma, também não conseguem entregar o que se espera. Ainda mais se colocados em situações as quais não estão acostumados.
Diante de Nova Iguaçu e Madureira, os dois jogos antes da final da Supercopa, Paulo Sousa vai novamente rodar o time e tentar dar ritmo à maioria antes de esboçar seu onze ideal. Se não pode fazer todos os testes que gostaria, ao menos terá uma ideia do que cada atleta pode entregar nas variações táticas que projeta para o Flamengo.
Se depois o téncico precisará se render ao que o time entende ser o mais confortável a se executar, só o tempo e os resultados dirão. Mas não se poderá culpar Paulo Sousa por não ter experimentado e buscado outras soluções para criar alternativa ao estilo que o Flamengo joga desde 2019, mas que seu elenco já não consegue mais entregar no mesmo patamar.
Aí abre-se um novo parênteses. Os testes realizados na pré-temporada extendida também são ótima oportunidade para identificar carências que outros treinadores tiveram dificuldades de detectar, justamente pela falta de tempo para treinamentos e observações. Com a diretoria no mercado, o feedback de Paulo Sousa sobre o que vê no campo pode nortear a procura de peças de reposição e por soluções que o elenco atual, tido como um dos melhores do Brasil, não oferece em alto nível.
Basta observar a volta de garotos da base ao status de soluções. Casos como de Lazaro, que atuou de ala, Matheuzinho, na mesma função pela direita, ou também o zagueiro Cleiton, pela esquerda, e João Gomes, volante capaz de marcar e também construir. Se não são capazes ainda de barrar medalhões, ao menos oxigenam o elenco e dão opções enquanto não há fartura para usar no calendário apertado que vem por aí.
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