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Cadafalso de um camisa 10

Por Marcos Vinicius Cabral

A colher de cal foi quando o árbitro Wilson Carlos dos Santos parou o jogo, pegou a bola e cumprimentou o 10 rubro-negro, encerrando a partida.

Foi aos 43 minutos do segundo tempo, daquele 6 de fevereiro de 1990, que o Galinho de Quintino dava seu último suspiro em vida antes de sua partida do mundo do futebol.

Sepultado em definitivo, Zico encenava seu derradeiro ato, correndo sozinho no gramado do Maracanã, se desvencilhando de algumas crianças e de um repórter que tentou implacavelmente em vão colher dele algumas palavras.

Naquele estádio que recebeu o nome de um ilustre Rubro-Negro chamado Mário Filho, onde bola e rede se beijaram 333 vezes graças aos seus pés, todos os olhos, sejam nas arquibancadas ou na TV, buscavam não mais suas jogadas mas sim a ausência delas a partir de então.

Na volta olímpica imaginária, a mão direita acenava para o coro de 89.622 torcedores que gritavam um “Ei, ei, ei, Zico é nosso rei”, em retribuição ao maior patrimônio que o filho mais ilustre da família Antunes poderia ter: a torcida.

Não haveria, a partir das 23h23 daquela terça-feira, crianças pedindo autógrafos, gritos da torcida, treinos exaustivos até tarde da noite em cobranças de faltas, colhete enxarcado de suor, ataduras sendo retiradas dos pés, concentrações, viagens, entrevistas…

Não, infelizmente para os que apreciam o futebol bem jogado, não!

E, para mim, que aos dezessete anos, sofria por sua causa pela segunda vez (a primeira teria sido quando saiu de campo quebrado contra o Bangu cinco anos antes), aquela noite seria inesquecível, porém, amargamente triste.

O futebol é um paradoxo que se equilibra em duas pontas: alegrias e tristezas, sorrisos e lágrimas, vitórias e derrotas e por que não dizer, estreias e despedidas.

Certa vez, em mais um rompante de genialidade, dessa vez fora das quatro linhas, Falcão, craque do Internacional e Seleção Brasileira profetizou: “O jogador de futebol morre duas vezes. A primeira, quando para de jogar”.

Mas foi ali, mesmo vendo pela TV, que Zico morria em definitivo.

Mas morreu dignamente, deixando um legado inestimável aos que fazem da carreira de jogador de futebol seu ganha pão.

Foi exemplo de dedicação, de amor à profissão, de companheirismo, de humildade e venceu com bravura seus desafios.

Sim, fez isso com a mesma classe que driblava seus adversários com a simplicidade de sempre em busca do gol.

Foram muitos e alguns antológicos.

Com a bola nos pés, foi arco e flecha e como água, havia fluidez ao ultrapassar os obstáculos.

Mas foi naquela fatídica noite para muitos apaixonados por futebol, que o maior camisa 10 do Flamengo deu seu pontapé inicial em seu altruísmo com o seu próximo, ao doar pela primeira vez a renda daquela despedida da vida futebolística para à Casa do Hemofílico.

Continuaria fazendo o bem sem olhar a quem anos depois, em cada edição do Jogo das Estrelas, em dezembro.

Zico foi grande e sua grandeza o tornou humano demais para se relacionar com as pessoas.

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O homem que vestiu a 10 e honrou o Manto Sagrado em vermelho e preto, se desacorrentou da exposição que a vida de jogador de futebol tem e virou tudo: boa praça, boa gente, bom personagem para TCC de faculdade, e virou até YouTuber.

Portanto, há 30 anos não temos mais o Zico.

O Zico que encantava e desencantava.

O mesmo Zico que não foi campeão do mundo pela seleção, mas valorizou cada Carioca, Guanabara, Rio e Brasileiro.

O que não beijou a taça mas deu demonstrações de carinho com seu semelhante e com colegas de profissão.

Zico se foi e na mente daquele garoto de dezessete anos à época, a lágrima, 30 anos depois, ressurgiu.

Confesso, timidamente.

Se pudesse voltar no tempo e ter direito a fazer três pedidos, pediria:

Primeiro: que Zico não parasse nunca de jogar.

Segundo: que Zico não tivesse machucado nunca seu joelho.

Terceiro: que Zico tivesse sorte melhor com a camisa da Seleção Brasileira.

No mais, Zico vive!

Em tempo: tive a oportunidade ainda em vida de conhecer o Zico em 2016, quando pintei um quadro dele em ação contra o Atlético-MG e fui no CFZ para entregar.

Obrigado Deus pela oportunidade e obrigado Zico, por existir!

Fonte: https://colunadofla.com/2020/02/cadafalso-de-um-camisa-10/

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Redação Flamengo RJ

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