Enquanto estão na função nos bastidores dos clubes, os dirigentes fazem de tudo para esconder as informações e, principalmente, polêmicas que rondam o elenco. Porém, quando a resenha é liberada não faltam histórias para contar. O GloboEsporte.com recebeu a visita de Marcos Braz, vice-presidente de futebol do Flamengo em 2009, ano da conquista do hexacampeonato brasileiro. Após mais de 1h30 de conversa, lembranças, risadas e relevações sobre a trajetória do grupo até levantar a taça.
Entre os muitos momentos relembrados durante a entrevista, Braz usou grande parte do tempo para mostrar como era o relacionamento com os jogadores, especialmente com Adriano. Desde a polêmica queimadura, que o tirou da partida decisiva contra o Corinthians, o dirigente teve que lidar com problemas do atacante, que chegou até mesmo a assustar por desaparecer momentos antes do encontro com Luiz Inácio Lula da Silva, então presidente da república, após a conquista do título.
– Ele deixou a gente de cabeça em pé uma vez. Era dia do encontro com o Lula e com a Dilma. Tinha um encontro, Flamengo
campeão brasileiro, tinha que cumprir o protocolo. Naquela época era praxe o
campeão ir ao presidente da república. Os jogadores meio de férias, cada um
sairia de um lugar. Não precisa falar que o Adriano não embarcou no horário
certo (risos). E eu e o Isaías ficamos, “Adriano, você tem que vir, é o presidente da república”.
Aos 49 do segundo tempo ele fretou uma avião, estava chovendo demais, mas chegou lá
meia hora, 20 minutos antes do evento. Todo mundo iria estar com o presidente
da república. O Lula pegou o Adriano, puxou para o canto e falou, “menino, a
gente precisa de você, você vai ser importante para a Copa do Mundo”. Nisso a de 2010. O Lula
ficou bastante tempo conversando com o Adriano. Ele é uma pessoa introspectiva,
que não faz mal a ninguém, a não ser a ele mesmo. Se você falar que o Adriano
divide grupo, que faz mal pra alguém… Nunca dividiu grupo, mas faz mal a ele
mesmo e jogou duas Copas do Mundo fora.
Confira outros casos lembrados na entrevista:
Adriano e a queimadura polêmica
Nem gosto tanto de falar isso, mas eu tinha muita paciência
com o Adriano porque meu reserva era o Bruno Mezenga, o Dênis Marques. É fácil
passar por críticas, mas tinha que ter o bom senso (…) Não teve negociação
com o Adriano nessa história. Ele tinha tido problema da queimadura, nós já
tínhamos um calendário pronto em que iríamos para Atibaia antes do jogo contra
o Corinthians. Ele não queria viajar antecipadamente, mas sim fazer o
tratamento no Rio e ver se teria condições no sábado. Deixei bem claro que se
não fizesse o tratamento lá junto com os jogadores não iria jogar, e foi isso
que aconteceu. Papai do céu ajudou e ganhamos o jogo, depois ele entendeu a
minha posição. A gente não sabia se no dia do jogo teria possibilidade dele
jogar ou não. O que falo é que a não ida dele para Atibaia impossibilitou essa
chance de no dia do jogo poder jogar.
Maior problema que teve para administrar em 2009
– Na reta final a gente teve um problema do Léo Moura com o
Álvaro. O Léo já não estava mais no relacionamento da época, uma ex-namorada,
como todos temos na vida. Era a cantora Perlla. Um jornal me ligou alertando
desse problema, que o Álvaro poderia estar saindo com a Perlla, que isso seria
colocado na imprensa logo que tivesse a confirmação. Não tinha o direito de
pedir ao jornalista que não desse a matéria, mas pedi só que não desse naquele
momento para eu conversar com o jogador. No outro dia, se ele entendesse que tinha
que dar, tudo bem. Liguei para o Isaías Tinoco na hora. O Flamengo estava
saindo do treinamento para ir à concentração. Chamei o Bruno, capitão na época,
e disse que ele teria que conversar com o Léo Moura e o Álvaro. Os três teriam
que chegar a uma conclusão, que não tivesse nenhum tipo de desconforto depois
que saísse na imprensa. Foi tão natural e bem resolvido que quando saiu não
teve tanta força. Mas era uma reta final de Campeonato Brasileiro, imagina a
situação que eu estava?
Efetivação de Andrade
– Era segundo semestre de 2009, mas foi uma semana muito
difícil. No começo da semana, o Cuca, o auxiliar e toda a parte que trabalhava
ligada a ele tinha sido demitida. Dois dias depois o Kléber (Leite) e o Plínio
(Serpa Pinto) também saíram. Cheguei para substituir o Kléber, com quem tenho boa
relação até hoje, mas sem técnico e auxiliares. O Andrade tinha aquele problema
que as pessoas achavam que nunca se dava a oportunidade para ele, ou que não
tinham paciência. A gente colocou ele contra o Santos, ganhamos, mas antes do
jogo eu falei com ele, “é injusto eu chegar, te botar nesse jogo e te tirar
daqui a dois, três jogos. Se vou ter outro técnico ou não, não sei, mas nos próximos
três, quatro jogos você é o técnico do Flamengo”. Tive uma boa percepção na
hora, isso deu tranquilidade pro Andrade. Nunca tínhamos ganho na Vila Belmiro
no Brasileiro, num jogo que o Flamengo sai perdendo, estreia do Luxemburgo (no
Santos), e o Flamengo vira e ganha o jogo.
Pet e a cobrança do bicho
– Foi uma má interpretação do Pet em relação a isso, mas não
foi na maldade. O que aconteceu foi o seguinte, a cada quatro pontos seguidos o
Flamengo tinha uma premiação. Tiveram dos jogos que o Flamengo ganhou em casa e
fora. O Pet entendia que tinha que ter uma bonificação a mais em cima do bônus.
O problema com o Pet começou aí. Quando eu assumi a vice-presidência na época
ele estava afastado por determinação dos outros dirigentes. Quando assumi
determinei que fosse reintegrado, liguei para o preparador físico para que
desse uma atenção, e assim foi feito. Seria um louco se quisesse ter tido
problema gratuito com o Pet. Não quis ter em nenhum momento, ao contrário, mas
nesse encontro, num ambiente de estresse, isso potencializou uma situação que
não tinha problema nenhum. Não se resolveu, eu paguei o que tinha acordado.
Nesse dia fui no Bruno e em outros dois jogadores. Não podia ficar mal com o
grupo, porque tinham que ter o entendimento que estava correto no que acordei,
mas também não queria colocar o Bruno e o Adriano contra o Pet.
Relação com o goleiro Bruno
– Nenhum problema, tudo que tratei com ele, o Bruno cumpriu. Em 2009
não tive nenhum episódio que pudesse arguir ele, ou perguntar. Tudo que foi
tratado era cumprido. Quando estávamos para vender o Sheik ou não, o Bruno
chegou e falou, “Marcos, veja se conseguem pagar os garotos e salários menores,
e deixa a gente (Pet, Adriano, Willians), que a gente segura um pouco”. Acho
que isso é legal eu falar agora, não por ele estar na situação que está agora.
Minha análise é com o Bruno jogador, capitão. Comigo foi correto até o final.
Renato Abreu, Toró e a pancadaria num amistoso
– Sabe um jogador que tive problema quando fui diretor de
futebol, hoje é meu camarada? Até citou isso na entrevista de despedida do Flamengo.
Foi o Renato Abreu. O time conseguiu sair numa pancadaria num amistoso no
Uruguai. Na saída do campo o Toró deixou o pé no Renato. Imagina, o Toró, um menino, e o Renato, cascudo, olha para trás e está o
Toró chutando no ele (risos). No meio de um problema desse, num vestiário… Um estádio
que foi feito em 1934 para a Copa do Mundo do Uruguai, o Centenário. Vestiário
claustrofóbico, e começa a discussão. Fui pedir calma ao Renato, “é um menino,
ele está errado, você está certo”. Ele disse, “comigo só fala o presidente”. Aí
deu problema também. Aí falei o que tinha que falar para ele. Foi meio aquela briga de galo e parou, tudo por causa do Toró.
Início da “Era Patrícia Amorim”
No dia da premiação dos melhores do Brasileirão, que o Adriano não foi, a Patricia Amorim ganha a eleição no Flamengo. Queria
fazer as coisas dela, a gestão dela, mas ficou um desconforto comigo, que tinha
acabado de ser campeão. Se ela entendia que deveria me deixar lá, devia me dar
100% de apoio. Se entendia que deveria trocar, tudo bem, procedimento normal e natural,
Flamengo ia continuar a ser o Flamengo. A vida continuaria. Mas imagina segurar
esses jogadores todos, todos com proposta, sem exceção. Roma em cima do
Adriano, o Éverton já estava tendo problema, o Álvaro tinha proposta, e a gente
conseguiu segurar quase todo mundo. Consegui trazer o Vágner Love sem o Flamengo
gastar um real, num gancho de uma briga da torcida do Plameiras num shopping,
convenci ele a vir. Foi um bom trabalho, respeitei a instituição, sou muito
grato. Fui secretário de esporte do Rio de Janeiro por esse nome que peguei no Flamengo.
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