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Perguntas e respostas (nem sempre afinadas) da disputa Léo Moura x Fla

O casamento havia sido desfeito no ano passado, sem rancor e com despedida emotiva. Mas a notícia de que Léo Mouraacionou o Flamengo na Justiça por direitos trabalhistas pegou os torcedores – e até o clube – de surpresa.  Na ação que corre em sigilo, o lateral, que disputou 519 partidas pelo clube, cobra o pagamento de horas extras, adicional noturno e direito de arena (televisão) no período de 2011 a 2015. O advogado do atleta diz que o valor cobrado pode chegar a R$10 milhões. Para tentar esclarecer dúvidas sobre o caso e tentar entender quem pode de fato sair vitorioso na disputa do tribunal, o GloboEsporte.com ouviu especialistas do âmbito do futebol e também buscou opinião de juristas.

Do lado da bola, a advogada Gislaine Nunes, que obteve vitória em litígios como o de Ronaldinho Gaúcho com o Flamengo, em 2012, e o de Juninho Pernambucano contra o Vasco, em 2001. O jurista Flavio Aldred Ramancciotti,  sócio responsável pela Área Trabalhista do Chediak Advogados, representou a vertente dos que não atuam na área esportiva.

Advogado de Léo, Leonardo Laporta Costa explicou que seu cliente pede uma diferença da ordem de 20% de antes da alteração da Lei 12.395 e 5% da diferença dos novos contratos, firmados depois da alteração. Também contesta um acréscimo reembolsatório pelo período de concentração, uma vez que, segundo o advogado, no contrato do jogador não foi estabelecido um adicional equivalente no respectivo regime de concentração. Também é pedido o pagamento de hora extra e adicional noturno.

Para quem não é tão familiarizado assim com internet, o termo “FAQ” é um acrônimo da expressão inglesa “Frequently Asked Questions”, que pode ser traduzida por “Perguntas Mais Frequentes”.

Léo cobra o chamado direito de arena. Flamengo alega que o sindicato dos atletas é responsável pelo repasse. Quem está correto?

Gislaine: O direito de arena hoje está regulamentado pela Lei Pelé desde de 2011.
A Lei especial fala em repasse
de 5%, e é feito via sindicato por conta de um acordo com os
clubes, este repassa e aquele paga aos atletas. Pois bem, o artigo 42
parágrafo 1, estabelece na Lei 9.615/98 com sua alteração pela Lei
12.395/11 que sempre será repassado o valor de 5% aos atletas sobre o
montante recebido pelos clubes e tem natureza civil. Vamos lá, atletas que participaram de partidas depois da alteração não podem
pleitear os 20%, apenas 5%. A Lei veda pleitear esta verba na Justiça do
Trabalho, porém eu discordo e ainda pleiteio na Justiça do trabalho esta
verba. É normal que os advogados peçam os 20%.

Flavio: Entendo que o Clube pode ser responsabilizado por tal pagamento, caso o Sindicato não o faça, ou caso o Clube não tenha repassado os valores para o Sindicato. Não temos informações sobre o que, de fato, aconteceu. É muito comum, todavia, que os atletas processem os clubes. As decisões do TST sobre o assunto envolvem sempre os clubes.
 
Não tive acesso a nenhum documento, mas provavelmente a alegação do Flamengo se baseia na redação do artigo 42 da Lei Pelé (Lei 9.615/98) com as alterações da Lei 12.395/2011. Pela nova redação, os clubes devem repassar os valores “aos sindicatos e atletas profissionais, e estes distribuirão, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo”.

Explique, por favor, essa alteração na Lei Pelé (a lei de alteração é 12.395/2011). Pelo que entendemos, direito de arena passou de 20% para 5%. Em compensação, os clubes teriam de incluir uma cláusula compensatória pelas horas trabalhadas em regime de concentração.

Gislaine: O que existe de cláusula compensatória é o recebimento do atleta pelo clube, quando este (clube) der causa à rescisão.

Flavio: Entendo que uma coisa não tem relação, necessariamente, com a outra. A redução de 20% para 5% decorre de expressa previsão da lei (Lei 12.395/2011), talvez por conta de uma questão histórica: quando a Lei Pelé previa 20% de direito de arena foi feito um acordo entre os clubes e sindicatos reduzindo esse percentual para 5%. Esse acordo é considerado nulo pela Justiça do Trabalho, de forma que os processos que se referiam aos anos anteriores a 2011 e onde houve o pagamento do direito de arena de 5% (por conta desse acordo), o TST entendeu nulo o acordo e condenou os clubes a pagarem a diferença.
 
Todavia, a Lei 12.395/2011 trouxe outras alterações na Lei Pelé, dentre elas a necessidade de se prever no contrato do atleta profissional os “acréscimos remuneratórios em razão de períodos de concentração, viagens, pré-temporada e participação do atleta em partida, prova ou equivalente, conforme previsão contratual” (inciso III, do §4º do art. 28 da Lei Pele – nova redação).
 
Assim, esse “acréscimo remuneratório” não deve ser considerado como uma “compensação” pela redução do percentual do direito de arena, mas como uma nova obrigação que deve ser prevista no contrato entre o atleta e o clube. Não tive acesso a esse contrato.

Existe uma lei que regulamenta quantas são as horas de trabalho do jogador do futebol? Sendo assim, é possível cobrar horas extras?

Gislaine: A Lei Pelé estabelece uma carga de horária de trabalho de 44 horas
semanais (artigo 28, paragrafo 4, inciso VI). Ultrapassou isto,
subentende-se que há o direito a pleitear horas extras, porém a Lei tem
suas especificidades, como concentração. A concentração não pode ser
superior a três dias consecutivos semanais, artigo 28 paragrafo 4,
inciso I. Caso venha a passar este período de três dias, poderá pleitear
horas extras desde que os jogos não sejam fora da localidade onde tem a
sede do clube. Logo, neste caso de viagem para partida fora da sede do
clube, não tem direito a pleitear horas extras, sequer adicional noturno.
Apenas um esclarecimento: a meu ver pré-temporadas incidem horas extras
sim, porque o atleta fica a disposição do clube 24 horas por dias e
dias, bem como cabe adicional noturno.

Flavio: Sim. A jornada é de 44 horas semanais (inciso VI, do parágrafo 4º, do art. 28 da Lei Pelé, com a redação da Lei 12.395/2011). Portanto, em tese, é possível cobrar horas extras, desde que tenha havido trabalho extraordinário.
 
A própria Lei Pelé, no parágrafo 4º, do artigo 28 (com a redação dada pela Lei 12.395/2011) reconhece que a relação entre o atleta profissional e o clube tem algumas peculiaridades. Por isso, por exemplo, a lei expressamente permite a realização de concentração por até 03 dias consecutivos por semana, sem que isso seja considerado acréscimo à jornada de trabalho. Os acréscimos remuneratórios por esses períodos, devem constar do contrato do jogador. Para melhor analisar a questão específica do Léo Moura, seria necessário analisar o contrato dele com o clube, documento que não tive acesso. 

Veja a redação do §4º, do art. 28 (no fim da matéria)*

Cobrar adicional noturno por concentrações é correto?

Gislaine: Dentro do prazo estabelecido pela Lei não.

Flavio: Desde que a concentração não exceda três dias por semana, entendo que não. Apesar de não ser pacífico, há decisões que entendem que deve ser pago o adicional noturno se o trabalho for após às 22h, como por exemplo, nos jogos que começam às 22h.

Há (ou é conhecido) algum caso de atleta que conseguiu vencer na Justiça em caso semelhante a Léo Moura?

Gislaine: Não conheço nenhum caso semelhante e espero que ele tenha o justo, o que lhe couber.

Flavio: Aqui temos que separar as questões. Com relação ao direito de arena, o TST tem decidido que o atleta tem direito e que esse valor deve, ainda, ser base de cálculo para os reflexos em 13º salários, férias e FGTS. Há muitas decisões nesse sentido.

A questão das horas extras, em especial, pela concentração, depende se a concentração não exceder três dias da semana (nesse caso não é computada como jornada de trabalho) e de como como é tratado no contrato os “acréscimos remuneratórios” previstos no inciso III, do § 4º do artigo 28, acima transcrito. Para tal resposta, é necessária a análise do contrato.
O adicional noturno pode ser devido pelos jogos realizados após às 22h, mas isso não é pacífico na jurisprudência. Há decisões no sentido de ser devido e outras em sentido contrário.

*VEJA A REDAÇÃO DO §4º, DO ART. 28:

“Ar. 28 – A atividade do atleta profissional é caracterizada por
remuneração pactuada em contrato especial de trabalho desportivo,
firmado com entidade de prática desportiva, no qual deverá constar,
obrigatoriamente:
§ 4º – Aplicam-se ao atleta profissional as normas
gerais da legislação trabalhista e da Seguridade Social, ressalvadas as
peculiaridades constantes desta Lei, especialmente as seguintes:
I –
se conveniente à entidade de prática desportiva, a concentração não
poderá ser superior a 3 (três) dias consecutivos por semana, desde que
esteja programada qualquer partida, prova ou equivalente, amistosa ou
oficial, devendo o atleta ficar à disposição do empregador por ocasião
da realização de competição fora da localidade onde tenha sua sede;
II
– o prazo de concentração poderá ser ampliado, independentemente de
qualquer pagamento adicional, quando o atleta estiver à disposição da
entidade de administração do desporto;
III – acréscimos
remuneratórios em razão de períodos de concentração, viagens,
pré-temporada e participação do atleta em partida, prova ou equivalente,
conforme previsão contratual;
IV – repouso semanal remunerado de 24
(vinte e quatro) horas ininterruptas, preferentemente em dia
subsequente à participação do atleta na partida, prova ou equivalente,
quando realizada no final de semana;
V – férias anuais remuneradas
de 30 (trinta) dias, acrescidas do abono de férias, coincidentes com o
recesso das atividades desportivas;
VI – jornada de trabalho desportiva normal de 44 (quarenta e quatro) horas semanais.”

Fonte: http://globoesporte.globo.com/futebol/times/flamengo/noticia/2016/10/perguntas-e-respostas-nem-sempre-afinadas-da-disputa-leo-moura-x-fla.html

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