A defesa do Flamengo sofreu mais um revés no caso do incêndio no Ninho do Urubu, após o vazamento de emails que mostram que o clube sabia dos riscos do alojamento da base desde 2018. O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) acusa o clube de tentar coagir os 16 sobreviventes, conforme mostra documento obtido pelo “UOL”. Logo após a morte dos 10 meninos da base, a diretoria rubro-negra procurou as famílias dos sobreviventes e propôs uma indenização de R$ 20 mil para cada um por danos morais. O recebimento do valor só seria feito se os jovens renunciassem ao direito de acionar o clube na Justiça por outros prejuízos.

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Como consta no documento, o MPRJ acredita que “o discurso de que os documentos deveriam ser imediatamente assinados deixava claro que se tratava de uma pré-condição para que os adolescentes permanecessem como atletas da base do clube”.

Em fevereiro deste ano, o MPRJ pediu que o Flamengo seja condenado a pagar R$ 20 milhões em danos morais coletivos. Na petição, o órgão ainda diz que o clube “teria agido com coação e/ou com dolo para fins de inviabilizar que os jovens atletas sobreviventes pudessem preservar seus direitos”.

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Apesar de todos os sobreviventes terem chegado a um acordo, o MPRJ quer a anulação de todos eles por entender que a estratégia do Flamengo “pretende se beneficiar de uma situação de desequilíbrio de poder e de informação com relação às vítimas”.

Novos acordos de indenização

Com os novos fatos no processo, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro afirma que as famílias dos meninos mortos que já celebraram algum tipo de acordo podem pedir revisão dos valores das indenizações, segundo o site “Ge.com”. Até o momento, o Flamengo fechou acordos com os parentes de Jorge Eduardo, Samuel Thómas, Áthila Paixão, Gedinho, Rykelmo (lado paterno), Vitor Izaias e Bernado Pisetta. Faltam os acertos com as famílias de Arthur Vinícius, Pablo Henrique e a mãe de Rykelmo.

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Na quarta-feira, a Defensoria Pública havia afirmado, em nota, que “esses documentos são a prova inconteste da responsabilidade do clube, e serão anexados à ação coletiva”.

As irregularidades no CT

Na documentação apresentada pela Anexa, contratada depois do incêndio para uma vistoria nas instalações elétricas, não havia nenhuma emissão de anotação de responsabilidade técnica (ART), obrigatória pela Lei 6.496/77 para as atividades técnicas de projeto e execução. Também não havia um aceite técnico referente às instalações contidas nos módulos do Ninho do Urubu.

Reprodução de imagem em relatório sobre o CT Foto: Reprodução

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O que a Anexa verificou foi que, dias antes da tragédia houve um chamado do Flamengo para um suposto incêndio em um dos equipamentos de ar. O clube chamou o senhor Edson Colman, conhecido como “Geladinho”, da empresa Colman Refrigeração. Ele relatou manutenção na fiação interna do aparelho, com substituição de algumas conexões. O aparelho danificado foi reinstalado no dia 7 de fevereiro, um dia antes da tragédia. Segundo a vistoria nos componentes que sobraram, os aparelhos de ar condicionado funcionavam aproximadamente 24 horas por dia.

Conforme a troca de e-mails entre os ex-funcionários Luiz Humberto, gerente de administração, e Marcelo Helmann, diretor executivo da pasta, em 10 de maio de 2018 houve visita ao alojamento do técnico de segurança do Flamengo, acompanhado do profissional chamado apenas de Adilson, da empresa CBI. O senhor Adilson informou, segundo relatório da Anexa, “que a situação encontrada no módulo da base era de alta relevância e grande risco”.

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Há ainda destacado os pontos emergenciais, enviado pelo funcionário do departamento pessoal Wilson Ferreira ao gerente de administração do Flamengo, Luiz Humberto Costa Tavares, à gerente de recursos humanos Roberta Tannure e a um funcionário identificado como Douglas Silva Lins de Albuquerque em 11 de maio: “quadro elétrico (poste ao lado do refeitório), disjuntores e fiação no jardim, quadro elétrico atrás do alojamento da base”.

Uma proposta de manutenção foi enviada a Flamengo ainda em maio de 2018 com os seguintes serviços: instalar um quadro de proteção, com os disjuntores e cabos dimensionados para a carga apresentada. Segundo vistoria, os cabos conectados aos disjuntores estava mem desacordo com as norma técnicas, pois eram inferiores à espessura. Foi constatado ainda que a corrente de projeto era maior que a capacidade do condutor instalado, desconsiderando as ligações irregulares, ou “gambiarras”. Também não havia proteção de um fio terra no circuito principal do módulo.

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“Para surpresa, em inspeção realizada no local na data de 19/02/2019, verificamos que o objeto do contrato 15.1/18-PA, não havia sido realizado e as instalações continuavam as mesmas de quando a inspeção fora realizada, em registros fotográficos antes e depois do evento que culminou na morte de 10 adolescentes. Podemos perceber que o serviço que a empresa CBI foi contratada, não foi realizado, mantendo o mesmo alto grau de risco antes verificado. As tais “gambiarras” elucidadas na proposta, ainda estavam claramente no local, conforme apresenta a imagem”, diz relatório da Anexa.

Mesmo assim, o contrato foi dado como concluído e a última parcela referente à liquidação total foi paga no início de outubro de 2018 pelo Flamengo. Para o serviço, não foi emitida ART, de acordo com a Lei 6.496/77 e não háregistro formal de aceite de obra por parte do clube.