Se uma palavra pode definir a forma como o Flamengo se preparou para enfrentar o rival que lhe impusera sonora goleada em Quito, esta é adaptabilidade. Desde a escalação cheia de desfalques provocados pelo surto de Covid, passando pela maneira como tentou marcar a boa saída de bola dos equatorianos até a decisão de abrir mão de alguns traços mais característicos de seu jogo. Importava pouco ficar com a bola — o time teve só 32% de posse —, mas ser rápido com ela para aproveitar os espaços às costas da defesa equatoriana. Foi assim que o Flamengo construiu a goleada de 4 a 0.
Ainda que Domènec Torrent não estivesse à beira do campo, o resultado tem peso suficiente para devolver paz à comissão técnica, mesmo que o Flamengo tenha feito um jogo marcado mais pela boa estratégia do que pela execução perfeita. Além disso, o time sai com bons resultados de uma semana em que se viu dizimado pelo vírus e, para completar, está classificado por antecipação às oitavas de final da Libertadores,
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Não foi sempre confortável o primeiro tempo do Flamengo, mas o placar se construiu graças às decisões estratégicas da comissão técnica, que ontem tinha o auxiliar Jordi Guerrero no banco. Em Quito, ao adiantar seus dois meias para marcar os zagueiros do Independiente del Valle e fazer Gabigol pressionar o volante Pellerano na saída de bola, o Flamengo esvaziou seu meio-campo. Ontem, fez diferente.
Primeiro, optou por um 4-2-3-1, com Thiago Maia e Gerson de volantes, Gabigol iniciando na ponta direita e Lincoln na esquerda, com Arrascaeta como o meia central bem próximo do centroavante Pedro. A ideia era que os dois homens de frente fizessem uma pressão que nem sempre tentava o desarme. Ela variava de acordo com o dono da bola. Se ela estava com o goleiro ou com um dos zagueiros, a ideia era vigiar e cortar as linhas de passe até Pellerano, ficando entre ele e a bola. Ou seja, tirar seu conforto no primeiro passe. Por vezes, com ajuda de um dos homens pelos lados, que vigiavam os laterais. Além disso, havia sempre os volantes Thiago Maia e Gerson ocupando o meio-campo.
Não que tenha sido um plano perfeito, porque o Del Valle, bom com a bola, teve suas chances – o Flamengo permitiu 21 finalizações ao adversário. Hugo Neneca fez ao menos duas defesas difíceis.
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A capacidade e atrevimento do Del Valle, somada à decisão do Flamengo de explorar o que o rival tem de pior, tornaram o jogo atraente, com chances de lado a lado. E a qualidade técnica fez o Flamengo aproveitar as suas e chegar aos 2 a 0 antes do intervalo.
O que fez o Flamengo? Decidiu que a posse de bola, desta vez, não era primordial. Alterou estilo e jogou explorando os espaços concedidos por um Del Valle que combinava defesa adiantada e pouca pressão no meio-capo: um convite. A ordem era ser o mais vertical possível quando tinha a bola, chegar ao gol em poucos passes e, em sua maioria, em profundidade. Foi assim que Arrascaeta e Lincoln perderam as primeiras oportunidades. Até que vieram os gols, sempre graças à intenção de ser vertical com a bola. Uma reposição de Neneca achou Pedro e, dois passes depois, o lance era finalizado por Lincoln. Quatro minutos depois, aos 29, uma bola longa de Thiago Maia venceu outra vez a linha alta da defesa do Del Valle e Gabigol deu o 2 a 0 a Pedro. A esta altura, Gabigol fazia o centro do ataque com Pedro e Arrascaeta passara para a direita, algo mais próximo de um 4-4-2. A alternância se deu em vários momentos.
Mas chamou atenção mesmo a forma como o padrão do jogo não se alterou no segundo tempo: o Independiente del Valle seguia exibindo suas virtudes com a bola e sua calamidade ao defender. Enquanto isso, o Flamengo acelerava o jogo com passes em profundidade, mesmo que por vezes esperasse o rival mais atrás.
Os equatorianos até continuaram a criar chances de gol, como na bonita manobra que terminou em chute de Torres e mais uma boa defesa de Neneca. No entanto, a segunda etapa teria outra marca: a reabilitação de Bruno Henrique após atuações irregulares e problemas médicos.
Ele entrara antes mesmo do intervalo, na vaga de Gabigol, que saiu machucado. E, a rigor, seu estilo e sua velocidade casavam com o que a partida pedia e o Flamengo executava. Bruno Henrique passou a ser mais uma arma para explorar as costas dos defensores e dar opções de passe.
Foi dele o terceiro gol, nascido em outro lance em que se vê a defesa equatoriana correndo para trás enquanto o Flamengo manobra em poucos toques: cruzamento de Ramon, finalização de Arrascaeta e gol de Bruno Henrique no rebote do goleiro. Num jogo de uma nota só, também seria assim o quarto, em bonito passe em profundidade de Arrascaeta.