A celebração de uma obrigação.

Sempre eu hei de ser… exigente.

Vencemos o EMELEC o quarto colocado do fortíssimo campeonato Equatoriano, com uma atuação de gala de Éverton Ribeiro, que aos poucos vai provando que valeu, de fato, a pequena fortuna que pagamos por ele. Até agora a nossa Libertadores tem sido um exercício de bipolaridade! Amamos e odiamos, xingamos e elogiamos com uma intensidade doidivana. Não sei de onde vem tamanha agonia.

Comparada com a fatídica campanha do ano passado, esse ano vencemos apenas um jogo em casa, o único que a torcida pode se aproximar do time. Enfim, apenas na quarta-feira passada tivemos a oportunidade de mostrar o nosso amor, e mesmo de maneira tímida fomos correspondidos.

A importância da vitória vai além da classificação as oitavas de final da libertadores, deveria valer para começarmos a nos tornar, internacionalmente, grandes. Hoje, não somos mais o que fomos faz mais de 30 anos. Acontece que, apesar de passarmos para a próxima fase, ainda vamos aos trancos e barrancos. O time vem melhorando aos poucos, mas ainda é pouco para despertar a segurança dos torcedores.

Ontem durante a transmissão do jogo, acompanhando mais de 2000 mil torcedores no nosso chat (Tv Coluna do Flamengo no Youtube), pude ver amor e ódio em proporções inacreditáveis. Talvez excluindo Diego Alves, Éverton Ribeiro, Renê e Cuéllar, todos os demais foram amados e odiados.

Em alguns pontos a evolução do time é clara, como o posicionamento da defesa por exemplo, ou outro exemplo quando o Paquetá acerta em aparecer como opção para o Cuellar ou para os Zagueiros na saída de bola. E ainda, inacreditavelmente, Renê sendo opção pelo lado esquerdo para Vinicius Junior.

Ontem, em algumas (ainda poucas) oportunidades, Vini pode escolher entre cortar para o meio, passar para o meia que vinha pelo centro, ou tabelar com o Renê, como deve mesmo ser. Isso ocorreu por conta de dois fatores. O primeiro foi pela inoperância do lado direto do ataque do E_MELEC_A, e mais relevante, porque Renê descobriu que ele pode passar da linha branca no meio do campo. Não sabemos se foi uma descoberta de âmbito pessoal, ou o Barbi o ensinou. Ainda assim ele ainda cruza muito mal. No primeiro gol demos sorte, no passe para trás, a bola bateu no zagueiro adversário e sobrou para o goleiro, cada vez mais fixo, que sem tempo de bola deu um peteleco na redonda, no rebote, um chute de verdade (eu ia escrever de macho, mas nessa época de politicamente correto eu sempre me seguro) para estufar a rede.

Faz-se justiça, ontem, o nosso lateral esquerdo foi impecável na parte defensiva. O time ainda joga muito espaçado, e acho que não tem conserto com as peças que temos no elenco. Não vejo um planejamento tático de longo prazo no flamengo. De fato, não existe, já que trocamos de treinadores, com perfis diferentes, a cada mudança de estação – Dorival, Jorginho, Mano Menezes, Jaime de Oliveira, Ney Franco, Luxemburgo, Cristóvão Borges, Oswaldo de Oliveira, Muricy Ramalho, Zé Ricardo, Reinaldo Rueda, e Carpegiani.

Os torcedores, impacientes e ansiosos, acham que simples mudanças de jogadores ou posições fazem o time melhorar e se acertar definitivamente. Um exemplo clássico do clamor do torcedor por mudanças que resultou em tragédia, foi a mudança de Everton Cardoso de meia para lateral. Por mais que ele tenha tido alguma relação com a lateral esquerda, é preciso treino específico na posição, o que não se faz em um dia, ou mesmo uma semana. Quando finalmente o Paquetá foi recuado para ajudar na distribuição de bola, o time melhorou, mas não sem oscilação, tanto do jogador quanto do meio de campo e do time no geral.

Esse é o fato, essas mudanças dão certo hoje, mas amanhã, contra um técnico mais velhaco, não darão. Jogadores recém deslocados de suas posições originais oscilam. Por conta disso, pela falta de tempo para treinar, e pela falta de visão de tática, o Zé Ricardo foi parado na reta final do campeonato de 2016 pelo Carpegiani, Jair Ventura e Marcelo Oliveira. Em 2016, tínhamos um time bem montado, mas óbvio, fácil de marcar, era preciso mais tempo para ajeitar e variar o time, o treinador entendia que essas mudanças levariam tempo e nunca se quer as tentou. Quando o Zé Ricardo teve tempo para ‘brincar’ com o time, não o ajeitou, e foi-se. Por isso é apenas um técnico mediano, tem potencial, mas tem que estudar e precisa evoluir muito.

Hoje, os treinadores não usam o treino coletivo com a mesma frequência do que usavam no passado. Para fazer ajustes no time, o técnico deve olhar para o calendário e pensar: de hoje ao próximo jogo eu tenho que, por exemplo: ajustar a posição do zagueiro, reposicionar o volante na marcação, treinar a cobertura do lateral direito. Cada um desses pequenos detalhes leva um treino para ser treinado. Treino, ação de executar regularmente uma atividade física. Aí vem a nossa saga. Não temos tempo de arrumar o time como precisamos.

Ganhar a libertadores deve ser através de milagre sobre milagre como o torcedor gosta. Esse time, com o técnico que tem, pode engrenar e começar a jogar bem? Sim, pode. Mas isso só irá acontecer por sorte, e não por planejamento ou competência. De uma forma ou de outra estudando futebol, algumas vezes muito próximo e outras mais afastado, entendo o jogo como a antítese do que acontece hoje no Brasil. Vejo o futebol como trabalho sério, de longo prazo, com gente competente. No Brasil, e no Flamengo em especial, não se faz nenhum planejamento de longo prazo.

Defenda-se EBM; ele tentou, com as pessoas erradas. Rodrigo Caetano não conseguiu, se era capaz ou não, eu não tenho como dizer, mas o fato é que não soube planejar. A parada da copa do mundo vai ajudar, mas não apenas ao nosso time, a todos. Como o nosso temos mais talentos do que a maioria, pode ser que consigamos evoluir mais do que os outros, mas não criaremos a máquina de jogar futebol em 20 dias. Importante sempre destacar, não se ajeita o meio campo, posicionamento de jogadores e coberturas durante jogos, pode-se melhorar, acertar algum erro bisonho. Entretanto, o acerto dos detalhes, as trocas de posição, flutuações só acontecem em treinos. Coberturas, linha da zaga, posicionamento de bolas aéreas então, nem se fala… só em treino, muito treino, e com gente competente. Não é qualquer técnico que consegue transmitir essas ideias para os jogadores. Isso mesmo, além de saber o que se tem que fazer, além de saber como treinar, tem que saber como passar para o jogador. São poucos, pouquíssimos, no Brasil que tem essas três características.
Infelizmente, a única maneira que temos para nos tornarmos hegemônicos no futebol brasileiro será ganharmos um grande título, e que esse nos der tranquilidade para mantermos um trabalho e um padrão de jogo. Ou entendemos o futebol como um esporte de trabalho a longo prazo, ou continuaremos acreditando que futebol é sorte e acaso.

Antes, os exemplos eram internacionais e eram refutados pela diferença das realidades. Hoje, temos exemplos em estados vizinhos. Times com plantéis muito piores do que o nosso empilhando títulos enquanto celebramos a obrigação. Isso mesmo, comemoramos na quarta de noite o que deveria ser apenas a obrigação… passar de fase na libertadores para o time de maior torcida, com melhor etc etc etc… deverias ser corriqueiro.

Sim estamos carentes, sim estamos ansiosos, sim não aguentamos nos orgulharmos apenas de termos água nas torneiras do CT, de termos um ônibus que não quica, precisamos títulos, mas mais do que títulos, precisamos criar uma realidade baseada em planejamento sério, com profissionais que entendam de jogadores e jogadas, que não sejam comprometidos com empresários, e uma visão de como o Flamengo deverá jogar daqui a 2 anos, e com o DNA Rubro-Negro (qual é o DNA Rubro-Negro deverá a minha próxima coluna). Sim estamos todos felizes por estarmos classificados, mas quando acordarmos da bebedeira, veremos que estamos comemorando migalhas. Sim estamos felizes e demos alguns anos para o EBM nos tornar a grande potência, e não ganhamos nada, e se ganharmos esse ano será por sorte. No fundo, eu espero que os anos EBM para o futebol, não nos faça desacreditar em um projeto de médio prazo. Caso contrário, continuaremos levando com a barriga, para sempre, uma gestante que nunca vai parir, uma grávida do menino dourado que nunca nasce, mais do que ganhar a libertadores e o mundial em cima do Liverpool novamente, eu quero ser o maior time do Brasil e da América por muitos anos, sorte nos dará um ou dois títulos, planejamento nos dará a América.

Twitter – @fafochicca

Fonte: http://colunadoflamengo.com/2018/05/a-celebracao-de-uma-obrigacao/

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